sábado, 13 de outubro de 2012

Macumbas&Maioneses - parte 2


Em tese não nos veríamos mais. Acabou o meu trabalho na cidade e voltei para o Rio de Janeiro para começar a arriscar o pescoço no serviço mais perigoso em que já me meti. Só que num belo sábado tive que voltar para resolver uma pendência, jogo rápido, três horas da tarde á estava livre. Liguei pra ela e marcamos de nos encontrar nos quiosques na beira do rio. Tinha viajado pra lá com um colega de trabalho e esse colega de trabalho merece um parêntese.

(Esse Colega de Trabalho é o cara mais fudido que eu já tive o prazer de conhecer. O cara se fode sempre. O cara sempre se fodeu em tudo o que já se meteu na vida. Já foi taxista, disque-jóquei, síndico, sorveteiro, catador de material reciclável, dono de bar, dono de zona, marido de aluguel, desentupidor de fossas, auxiliar de pedreiro, auxiliar administrativo, eletricista, locutor de ofertas em loja de calçados e mais uma infinidade de coisas. Em todas elas se deu mal. Atualmente é o eletricista da lista que citei. Por enquanto ainda não se fudeu, mas é só uma questão de tempo. Todos nós sabemos disso. Pelo menos eu e ele.)

Pois bem, lá fomos eu e o Colega de Trabalho para o quiosque da beira do rio, chegamos uma hora antes do combinado e pedimos nossas cervejas. Numa mesa próxima uma loira e uma morena bebiam as cervejas delas e estavam completamente compenetradas em sua conversas, completamente alheias ao resto do planeta. Meu Colega de Trabalho se interessou na loira. Se interessou não, ele ficou fascinado pela loira. Cupido acertou uma flecha bem no meio de suas bolas. O cara não conseguia parar de olhar para a loira. Parecia que nem escutava o que eu falava.

- Não! Pode continuar, eu estou escutando.
- Tá, mas ela tá olhando pra você?
- Ainda não, mas relaxa que vai dar certo.

Eu sabia que aquilo não iria dar certo, mas sabia também que não poderia mover um centímetro sequer o curso implacável do destino de um fudido. Mandei ver na minha cerveja e segui explanando sobre como Luthero ferrou com os renascentistas quando justamente eles iriam implodir a Igreja Católica de dentro pra fora.

- O que tú acha de eu chamar o garçon, pagar uma cerveja e pedir pra colocar na mesa delas?
- Cara, ela olhou pra nossas mesa? Tomou conhecimento da nossa presença?
- Ainda não.
- Então sei lá cara, acho melhor você chamar o garçon e falar que alguém aqui do bar deu o presente. Assim força ela a observar as outras mesas e saber que está sendo paquerada. Assim sabe, forçar ela a entrar no clima. Sacou?
- Será?

Só que não deu tempo dele ponderar minhas palavras. A morena que estava com a loira levantou-se para ir ao banheiro e meu Colega de Trabalho resolveu interceptá-la. Fiquei apenas olhando a cena de longe e entornando mais um copo de cerveja. A conversa entre os dois durou um minuto, se muito, e ele voltou pra mesa. Parece que a morena não quis nem dizer o nome da loira (somente com a autorização da mesma) e não deu resposta quanto a proposta de juntarmos a nossa mesa com a mesa em que se encontrava a loira (somente com a autorização da mesma). A morena voltou do banheiro e as duas continuaram sua conversa, alheias à nossas existência enquanto seres chavecadores.

Foi quando meu Colega de Trabalho, num típico chute de pau de barraco que sempre lhe foi sempre peculiar, chamou o garçon e mandou servir uma cerveja na mesa das duas. Por sua própria conta. E risco, eu acrescentaria. Elas mandaram um muito obrigado via garçon e continuaram alheias a nós. Daí ele mandou outra cerveja pra elas. Elas continuaram alheias a nós e nem um muito obrigado mandaram desta vez. Uma terceira cerveja foi enviada e eu já estava começando a implorar para que a minha mina chegasse de uma vez para que, quem sabe em dois, conseguíssemos acabar com aquela palhaçada. Então ela chegou e fiz um rápido resumo da situação.

- Ah, você gosta de loiras? Espera aí que eu vou ligar para uma amiga minha.

Uma rápida ligação e em menos de quarenta minutos uma nova loira chegou no estabelecimento. Sentada em nossa mesa, desta vez. Feitas a apresentações, pedidos mais um copo e mais uma cerveja, eis que o filho da puta continuou olhando pra loira da outra mesa e não deu a mínima pelota para a nova loira. Pior, a presença da nova loira fez com que a minha mina passasse a conversar mais com a nova loira - a fim de não constranger a coitada com a situação constrangedora que havia sido criada, a ponto de eu tornar-me o Grande Miserável Segurador de Velas. Começei a dedicar-me às cervejas com empenho redobrado. Meu Colega de Trabalho, acometido por centelhas mínimas de bom senso, começou a dar-se por conta de que estava dando com os burros na água do rio ao lado do quiosque, passou a beber mais ainda do que eu. A noite já avançava (havíamos chegado no meio da tarde, convém relembrar) e eu já estava começando a ficar bêbado. Aquilo não tinha a mínima chance de dar certo.

Quando algo não tem solução, solucionado está. Decretei que pelo menos eu me divertiria de verdade naquela noite. Encarnei o cafajeste que existe dentro de cada homem - pelo menos os que contam, e comecei a soltar um comentário desagradável atrás de outro. A nova loira era manicure.

- Ei, você é manicure?
- Sim, porque?
- Então porque você não dá um jeito nas unhas desta sua amiga aqui? - e apontei para as mãos de minha mina, que virou a cabeça em minha direção.
- Idiota!
- Tá, mas essa sua blusinha Abacatão de Fim de Feira é em homenagem ao dia do hortifrutigranjeiro? É sério, hoje é o dia deles, vi nos top trends do Twitter.
- Vai te foder!

Meu Colega de Trabalho sentiu-se mal e foi para o carro dormir. Era ela o motorista, eu estava sem carteira. Daí as duas, minha mina e a nova loira, resolver inverter os papéis e passaram elas a me encher o saco, zoando com minha cara. Não achei aquilo nada elegante por parte delas. Mandei logo tomar no cú. Em vão, continuaram me zuando. A situação estava passando dos limites. Pedi mais uma cerveja. Enchi o copo até a borda, pedi para o garçon aguardar um instante, sequei o copo em poucos segundos, enchi outro, sequei também, sequei o terceiro e o restante da garrafa no gargalo e me dirigi ao garçon.

- Por favor, será que senhor poderia mandar, em meu nome, essa senhora aqui tomar bem no meio do olho do cú dela??!!

O resto do quiosque silenciou. O silencio durou nem três segundos e o Universo seguiu seu curso de expansão rumo ao infinito, voltando à normalidade eterna. Mas o clima na nossa mesa não voltou ao normal. Aquilo foi demais para a minha mina. A cidade era pequena, ela tinha conhecidos no local, uma coisa é brincadeiras internas, bem outra coisa é envolver terceiros. Não houve uma despedida, propriamente dita e ali fiquei, sozinho com dezenas de cascos vazios de cerveja, uns nas mesas e outro rolando no chão. Pedi a saideira, a conta e voltei para o Rio de Janeiro.

A loira e a morena da mesa ao lado continuaram lá, conversando. Provavelmente seguiram conversando mesmo depois que o quiosque fechou e mesmo depois que o quiosque reabriu. Vai ver eram reles miragens, dois fantasmas de duas garçonetes que morreram afogadas numa antiga enchendo que assolou o rio que ficava ao lado do quiosque. Provavelmente era isso. Talvez. A única certeza que eu tinha na mente era que tinha perdido minha peguete.

Acordei tarde, enjoado e sem dinheiro. A vida deveria continuar, os pombos continuariam cagando em nossas cabeças, enquanto bózons e mézons continuariam enlouquecendo físicos em aceleradores de partículas.

(continua)

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